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Saindo da tormenta que é uma manutenção corretiva

Saindo da tormenta que é uma manutenção corretiva

Retomamos aqui a história último postVocê já esteve no meio da tormenta que é uma manutenção corretiva?

Vamos relembrar o que aconteceu até agora.

Você é o gerente responsável por toda uma unidade industrial (planta) no interior do país. Responde ao diretor da empresa. Seus subordinados diretos são um grupo de quatro supervisores.

A planta é composta de dois pavilhões, os prédios A e B. Eles são interligados por dois transportadores de correia, denominados 1 e 2, dispostos em sequência. Entre os transportadores há uma casa de transferência convencional.

Nesta noite te telefonaram para falar que a planta estava parada sem previsão de retomar a produção. Uma manutenção corretiva (não esperada, não programada e potencialmente longa) é tudo o que você, sua equipe e a empresa não precisam neste momento.

A causa da parada? Uma falha no fornecimento de energia elétrica causou outra falha no sistema de controle dos transportadores de correia. O transportador 2 parou de imediato, mas o 1 rodou alguns bons segundos. Isto fez com que a casa de transferência ficasse cheia de material. Ela está praticamente soterrada.

Você decidiu ir à planta para acompanhar a equipe, e orientá-la se necessário, na solução do problema.

Quando chegou à casa de transferência, você já encontrou os supervisores que trabalham com você: Antônio, José Carlos, Lourdes e Luís, respectivamente responsáveis por operação, manutenção, SSMA (segurança, saúde e meio ambiente) e suprimentos.

Presenciou um início de discussão entre Antônio e José Carlos, a qual você interrompeu. Agora você e eles estavam prontos para conversar sobre como resolver este problema de maneira rápida e segura.

6º. Uma manutenção corretiva e diversas frentes de trabalho

Próximo a casa de transferência haviam algumas caixas de madeira fechadas com menos de um metro de altura. Você sentou numa delas e voltou a olhar para a casa de transferência soterrada. Os supervisores se aproximaram e alguns dos operadores também.

Você sabia que retirar o material da casa de transferência não era a única frente de trabalho desta manutenção corretiva. Os supervisores também sabiam disso.

A tua lista de frentes de trabalho

Você pediu emprestado ao Luís um bloco de anotações. Ele sempre carregava um bloquinho no bolso.

Pegou sua caneta e começou a escrever uma lista das frentes de trabalho. Não era uma lista completa, era um ponto de partida. Algo para te ajudar a organizar os pensamentos. A lista completa viria da conversa com os supervisores.

Sua lista tinha quatro itens:

  1. Remover o material que estava soterrando a casa de transferência.
  2. Feita a remoção, inspecionar se os equipamentos soterrados tinha alguma avaria e consertar.
  3. Identificar a causa da falha elétrica (provavelmente na subestação elétrica) e consertar.
  4. Inspecionar se, em outros locais da planta, havia ocorrido algum outro problema e consertar.

Você se lembrou do engenheiro com quem você trabalhou logo que saiu da universidade. Na primeira grande manutenção corretiva que enfrentaram juntos, uma estrutura que havia tombado, ele falou:

XXX– Uma coisa que você sempre tem que ter em mente é que manutenções corretivas grandes, como esta aqui, sempre tem mais de uma frente de trabalho. Não basta você se dedicar a frente principal, pois uma vez que ela esteja resolvida, restarão as outras. Você tem que atuar nas várias frentes simultaneamente. Mesmo que a principal demande a maior parte dos recursos, as outras frentes devem ser olhadas em paralelo.

A lista da tua equipe

Terminou de escrever a lista, olhou para os supervisores e perguntou:

XXX– Senhores, o que temos que fazer para colocar a planta para rodar de novo?

José Carlos, da manutenção, foi o primeiro a falar:

XXX– Temos que liberar a casa de transferência, isto é, retirar o material, checar a avarias nos equipamentos dentro da casa e consertar o que estiver quebrado. Assim conseguimos colocar os transportadores e toda a planta para rodar.

XXX– Mas e a falha elétrica? – Perguntou Antônio, da operação.

José Carlos olhou para ele e falou:

XXX– Temos que checar isto também. Acho que conseguimos fazer isto em paralelo com os trabalhos na casa de transferência, se você ajudar, – falou olhando para o Antônio.

Você imaginava o que o José Carlos tinha em mente, mas não queria conversar sobre isto agora, assim emendou mais uma pergunta:

XXX– O que mais temos que fazer?

XXX– Sugiro inspecionar toda a planta, para termos certeza de que não existem outros problemas, – falou Antônio. José Carlos assentiu com a cabeça.

Então Luís, perguntou:

XXX– Zé, qual a possibilidade de precisarmos de um guindaste na manutenção dos equipamentos da casa de transferência?

A pergunta do Luís era pertinente, pois a unidade não possuía guindaste. Quando havia demanda de um, ele era alugado. José Carlos olhou para ele e falou:

XXX– Bem lembrado, se tivermos de substituir o chute ou algum componente de um dos transportadores necessitaremos de um guindaste sim.

Luís olhou para mim e falou:

XXX– Até dois dias atrás estávamos com um guindaste alugado trabalhando na organização do estoque de produtos. O guindaste é da capital, mas acho que ele ainda está na cidade. Vou checar isto e se ele ainda estiver na cidade vou negociar com o dono do guindaste para que ele fique aqui mais alguns dias de prontidão, ok?

XXX– Bem pensado, Luís.

Lourdes então falou:

XXX– Estamos a mais de um ano sem acidentes com afastamento e nossas taxas de frequência e gravidade estão caindo. Temos que manter este padrão de segurança na manutenção corretiva.

XXX– Você tem razão, Lourdes. Vamos reforçar com todos os envolvidos na manutenção corretiva que a prioridade é a segurança. – Olhei para Lourdes. –  Você e sua equipe de técnicos de segurança devem apoiar os supervisores e suas equipes durante a manutenção corretiva.

A lista final

XXX– Vocês tem mais algum serviço em mente? – Perguntei a todos.

XXX– Acho que isto é tudo, – falou um deles.

XXX– Não me ocorre nada diferente, – falou outro.

Os outros assentiram. Assim, a lista final tinha seis frentes de trabalho. Além das quatro originais, você acrescentou os dois itens seguintes:

  1. Mobilizar guindaste e outros recursos “especiais” necessários para os serviços, conforme proposto por Luís.
  2. Atenção especial com a segurança nas outras cinco frentes de trabalho, conforme alertado pela Lourdes.

7º. Não despreze soluções temporárias

Você olhou para a casa de transferência soterrada, depois se virou para José Carlos e perguntou:

XXX– Como você está pensando fazer para liberar a casa de transferência?

XXX– De imediato, vou usar metade da equipe de turno, 15 pessoas, com carinho de mão, pá e enxada para remover o material de dentro da casa de transferência.

XXX– Por que você não usa uma das nossas pás carregadeiras?

5 coisas que você deve fazer numa manutenção corretiva - 2ª parte

Pá carregadeira. Photo by <Ricobino> at pixabay.com.

XXX– Mesmo a menor das pás carregadeiras que temos não consegue entrar dentro da casa de transferência. Não tem espaço entre as vigas e colunas. – Ele continuou. – A limpeza vai ter que ser manual, infelizmente. Depois da limpeza concluída vamos inspecionar as avarias dentro da casa, para ver o que precisamos consertar.

XXX– Você não precisa consertar de imediato tudo de errado que encontrar, concorda?

José Carlos olhou para você e então falou:

XXX– Entendi o que você está sugerindo. No início do próximo mês teremos uma parada de manutenção programada de dois dias em toda a planta. Fazemos o mínimo necessário para rodar até lá. O resto, consertamos durante a parada, ok?

XXX– Sim. É uma solução provisória, mas se ela salvar tempo para a produção é válida. Com uma condição: Os consertos provisórios feitos agora não podem trazer riscos para os operadores até a parada de manutenção programada.

XXX– Sim, com certeza. – Falou José Carlos olhando para Lourdes, do SSMA, que acompanhava a conversa com atenção.

8º. Tudo por uma previsão

Você ainda estava sentado na caixa de madeira quando falou:

XXX– Pessoal, tem mais duas coisas que preciso acertar com vocês antes de colocarmos a mão na massa. A primeira delas é uma previsão de quando a planta volta a produzir.

XXX– Difícil dar uma previsão agora, – falou José Carlos. Antônio assentiu concordando com o colega.

XXX– Sei que é difícil, – você falou. – Mas temos que dar alguma posição para empresa, especialmente para o diretor.

Você continuou a falar:

XXX– Zé, quanto tempo você acha que demoraremos para limpar a casa de transferência?

XXX– Como a limpeza vai ser manual, estimo umas 24 horas.

XXX– Quantos aos equipamentos soterrados, avarias e conserto. Qual o melhor cenário? E qual o pior cenário?

José Carlos falou:

XXX– Quero trocar uma ideia com os técnicos que trabalham comigo, pois eles já estão inspecionando a casa de transferência. Me dá uns 30 minutos?

XXX– Claro. Retomamos o assunto em 30 minutos.

José Carlos se afastou um pouco para conversar com dois técnicos que trabalhavam com ele e que estavam inspecionando a casa de transferência soterrada. Menos de trinta minutos depois ele retornou.

XXX– Alguma contaminação de óleo lubrificante nos equipamentos certamente ocorreu. Não acreditamos que a estrutura da casa sofreu avariais, mas as estruturas mais leves dos equipamentos podem ter sido deformadas pelo peso do material. – Falou José Carlos. – Assim temos dois cenários. No otimista só ocorreu contaminação do óleo lubrificante dos equipamentos. No pessimista, houve também deformação da estrutura deles.

XXX– Se for só a contaminação, quanto tempo para reparar? – Você perguntou.

XXX– Umas 6 horas.

XXX– E se houver a deformação da estrutura dos equipamentos também?

XXX– Hummm… Até 36 horas, num cenário muito ruim.

XXX– Então considerando que a limpeza da casa de transferência vai demandar 24 horas, no cenário otimista a duração total é de 30 horas e no pessimista de 60. É isto mesmo?

XXX– Sim, – respondeu José Carlos.

Você pensou um pouco e falou:

XXX– Tenho que dar um retorno para o Heitor sobre quantas horas a planta ficará parada. Vou falar que no pior cenário serão 60 horas, mas que ao longo do primeiro dia podemos revisar esta previsão, possivelmente para menor. Vocês concordam?

Todos assentiram.

9º. Heróis não são permitidos

Você voltou a conversar com José Carlos

XXX– De 30 a 60 horas de trabalho… Então será necessário várias equipes de limpeza e manutenção corretiva se revezando?

XXX– Sim. – Ele olhou para o Antônio. – Estou contando com parte da equipe de operação para fechar as turmas de revezamento.

XXX– Sim, com certeza, – falou Antônio.

XXX– Atentem para que as equipes não tenham jornadas excessivamente longas e que tenham o descanso adequado entre elas. Pessoal cansado tem mais risco de sofrer acidentes, – você falou e então olhou para Lourdes. – Ajude o José Carlos e o Antônio com a programação de revezamento, ok?

XXX– Estarei com eles, – respondeu Lourdes. – Vou orientar os técnicos de segurança para dar especial atenção para que todos os equipamentos em manutenção corretiva estejam desligados e bloqueados. Que não se faça uso de ferramentas improvisadas. E atenção também quando da remoção do material, para que não ocorra queda deste material sobre o pessoal.

Olhou para os quatro supervisores e então falou:

XXX– A segunda das coisas que preciso conversar com vocês é sobre segurança. Além do que já conversamos até agora, saibam que eu não quero heróis aqui, entenderam?

Pelas caras que os quatro fizeram, estava claro que eles não haviam entendido. Heróis? Você esboçou um sorriso e falou:

XXX– Na literatura clássica é comum o herói morrer no final da história. Nós não precisamos de heróis mortos. – Pensou um pouco. – Deixa em falar de um jeito diferente. Ninguém deve executar qualquer atividade sem as condições adequadas de segurança, mesmo que isto represente uma redução no tempo de manutenção corretiva. Isto não é justificativa para alguém se expor a riscos. Isto vale para vocês supervisores também. Ok?

Eles não sabiam se faziam cara de sério ou riam com a história do herói. A comparação com um herói (morto) parecia engraçada, mas o assunto era muito sério. No final todos acenaram que tinham entendido.

10º. Distribua os recursos

José Carlos olhou para o Antônio e falou:

XXX– Antônio, sei que você já trabalhou com manutenção elétrica no passado. Você pode verificar qual a causa da falha elétrica enquanto eu foco aqui na casa de transferência, na remoção do material e nos reparos. É esta a ajuda que eu preciso de você.

XXX– Pode deixar que eu faço isto sim. Quando determinarmos a causa eu te procuro para falarmos dos reparos eventualmente necessários.

XXX– Também vou colocar os operadores para inspecionar toda a planta, para verificarmos se há algum outro problema, – continuou Antônio.

XXX– Vou retornar a cidade para verificar a situação do guindaste. Se você necessitarem de algum outro recurso especial, me chamem no celular, ok? – Falou Luís.

XXX– Vou montar uma escala de revezamento dos técnicos de segurança compatível com a escala de operação e manutenção para poderemos apoiar vocês, – falou Lourdes.

XXX– Ok, vamos colocar isto em prática então, – falou você satisfeito que a distribuição de frentes que os supervisores fizeram entre si coincidia com o que você havia imaginado.

Na verdade você ficou MUITO satisfeito com isto, pois significava um nível de sintonia entre eles surpreendente, considerando que quando você chegou à área presenciou uma discussão entre dois deles. As coisas estavam se encaminhando.

Dica bônus: Você vai ter que contar até 10 (ou 100)

Você ficou observando os supervisores se afastarem, cada um indo para assumir seu papel nesta manutenção corretiva.

Você se levantou da caixa de madeira e pela dor que sentiu nas “costas” concluiu que a caixa não era tão confortável quanto parecia ser quando você sentou (rsrsrs).

Afastou-se um pouco mais da casa de transferência, entrando numa área de penumbra, na medida em que se afastava dos postes de iluminação.

Estava na hora de ligar para o Heitor com a previsão. Antecipou que ele reclamaria um pouco da previsão de até 60 horas. Você argumentaria que ela era uma evolução em relação aos três dias inicialmente falados e que precisavam, você e sua equipe, avançar na limpeza para dar uma previsão mais precisa. Ele entendia a posição do Heitor, muito da estratégia da empresa para este ano dependia do cumprimento da produção.

É fato você teria de ter paciência e foco para lidar com as pressões e as demandas aparentemente conflitantes que fazem parte de uma manutenção corretiva deste tamanho. Certamente você iria contar até dez diversas vezes. E quem sabe contar até cem também (rsrsrs). Mas no final, você tinha a convicção, que tudo daria certo.

Gostou deste post? No próximo post, na última parte desta história, darei dicas sobre o que fazer após uma manutenção corretiva.

Alexandro Avila de Moura
Engenheiro Mecânico graduado na UFRGS. Especialização em Gestão Estratégica (USP) e Gerenciamento de Projetos (Pitágoras). Mestrado em Administração incompleto (PUC MG). Experiência de mais de 25 anos no setor de mineração, especificamente nas áreas de gestão de operação, manutenção e desenvolvimento de projetos, liderando grandes equipes. Certificado como PMP (Project Management Professional) pelo PMI (Project Management Institute). Número PMP 182 8522. Experiência também nas áreas de segurança e saúde ocupacional, meio ambiente e relacionamento com comunidades e na área financeira.

1 pensamento em “Saindo da tormenta que é uma manutenção corretiva

  1. Nercy Grabellos disse:

    Muito bem, equipe bem montada e todos trabalhando em harmonia, contando com todas as frentes de trabalho e segurança, sem dúvida é um modelo a ser seguido.

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